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O dilema dos EUA: resgatar o passado ou construir um novo futuro?

RESENHA DE "ESTAS VERDADES", DE JILL LEPORE Barack Obama foi eleito presidente dos Estados Unidos, em 2008, utilizando-se de um slogan que ganhou fama mundial: “Change”. Nem durante a campanha eleitoral e tampouco no decorrer de seus dois mandatos foi possível entender com clareza qual seria essa mudança. Em 2016, Donald Trump conseguiu ser muito mais explícito ao prometer que tornaria a América grandiosa novamente. O empresário e apresentador de TV optou pelo resgate de valores do passado estadunidense para atingir em cheio ― e com sucesso ― o cidadão insatisfeito com o presente incerto deste início de século 21. Após oito anos de ações abstratas do governo Obama, seu sucessor não se furtou em propor uma série de políticas xenófobas, segregacionistas e protecionistas para chegar à Casa Branca.   Desde o primeiro dia de seu mandato, pairaram sobre Trump nuvens de ameaças à democracia dos Estados Unidos. Seu desastroso adeus ― marcado pela tentativa de autogolpe em 6 de janeir
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Cidadão Kane e as derrotas de Orson Welles

Ano sim e outro também aparecem por aí as velhas listas com os melhores filmes da história. São raras aquelas em que “Cidadão Kane” não aparece ao menos no top 3. Para muita gente que entende do ramo, nada mais justo, em especial por seus aspectos técnicos revolucionários e sua narrativa inovadora. Há um ponto, no entanto, que é pouco abordado e o engrandece ainda mais: sua contextualização política em um período delicadíssimo para a história dos Estados Unidos e de todo o planeta.  “Kane” foi planejado e produzido em meio aos anos que marcaram a ascensão de diversos regimes totalitários ao redor do mundo. Em 1941, ano de sua estreia, a França estava ocupada pela Alemanha nazista, a Europa se encontrava em polvorosa e os Estados Unidos, ainda se recuperando da crise econômica da década anterior, viviam o início de sua predominância política em nível mundial.  Se por um lado o governo Roosevelt se destacou por uma série de políticas progressistas, os anos de transição entre as décadas d

O legado burocrático da Europa do século 16

  Apesar de a Europa se encontrar dividida em termos políticos, sociais e religiosos em meados do século 16, a Monarquia de grande parte das nações do continente viu seu poder ser ampliado durante esse período. John H. Elliot, no segundo capítulo de seu livro “A Europa Dividida 1559-1598”, deixa de lado quaisquer fatores de ordem militar para explicar esse fortalecimento das famílias reais, concentrando-se em dois pontos bastante específicos daquela conjuntura: a ênfase que é dada para a organização administrativa e o maior controle exercido sobre a religião. Segundo o autor, o poder monárquico no século 16 vai ganhando maior autoridade na medida em que os procedimentos burocráticos e administrativos foram ampliados e praticados a partir de uma mentalidade profissional.   “O século dezesseis foi a primeira grande época do governo através de papeis”, afirma Elliott (p. 58), destacando que cada vez mais os documentos e assuntos governamentais passavam a ser registrados em “arquivos cui

Bismarck, unificação e as consequências da industrialização alemã

É impossível afirmar que um evento com a magnitude da Primeira Guerra Mundial tenha ocorrido por conta de um fenômeno isolado – são vários os elementos envolvidos. No entanto, para muitos historiadores e analistas, o papel geopolítico desempenhado pela Alemanha no final do século 19 foi um fator preponderante para o início do conflito. Este trabalho pretende analisar, pelo viés do desenvolvimento econômico da Alemanha, de que maneira um país unificado somente em 1871 pôde se transformar, em pouco mais de quatro décadas, em uma nação de primeira grandeza – a ponto de ser um dos protagonistas da Primeira Guerra. Que elementos – externos e internos – contribuíram para essa ascensão? Até que ponto é correto responsabilizar os alemães pelo estopim do conflito que viria a tirar as vidas de 19 milhões de pessoas? De 1789 a 1848 – anos cercados por revoluções Uma geração inteira, tanto na França quanto nos estados germânicos, cresceu sob o impacto direto das consequências da Revolução Francesa

Argentina e a importância de Sarmiento

Achei uns textos antigos. Vou republicar por aqui. Contradições do liberalismo na Argentina: Uma análise da trajetória de Domingo Faustino Sarmiento Em 1922, o Prêmio Nobel de Literatura Jacinto Benavente visitou por um mês a Argentina. A cada cidade por onde passava, jornalistas e curiosos perguntavam a ele suas impressões a respeito do país e de sua população, tarefa da qual o escritor se esquivou como pôde até o dia de sua partida. Ao subir no navio que o levaria de volta à Europa, Benavente disparou um verdadeiro “tiro de canhão”, naquela que seria sua definição sobre o povo local: “Formem a única palavra possível com as letras que compõem a palavra ‘argentino’” [1] . Desde então o caso é lembrado como piada para lembrar que o único anagrama possível com as letras de “argentino” é “ignorante”. A obsessão de Sarmiento Os argentinos de mais idade se lembram de tempos em que as escolas ensinavam aos estudantes uma série de hinos: o Hino Nacional , o Hino à Bandeira , a March